A palestra aconteceu no terceiro dia de debates do II Congresso da CSB, no dia 26 de fevereiro, em Brasília.
Para Denise Gentil, “não há nada de errado com a Previdência. O que está errado é o modelo do governo, é a política recessiva caótica que gera esse pesadelo para os trabalhadores”.
Segundo a pesquisadora, ao contrário do que é divulgado pela grande mídia, a Seguridade Social teve um superávit de R$ 35,5 bilhões em 2014 e R$ 16,1 bilhões em 2015, recursos que pertencem à assistência social, saúde e ao sistema previdenciário como determina o artigo 194 da Constituição.
Após o anúncio da presidente Dilma Rousseff de que o Brasil terá que “encarar” uma reforma na Previdência Social, o projeto se tornou uma das mais urgentes medidas do governo para conter a recessão econômica no país. De acordo com a União, o “déficit” de R$ 85 bilhões gerados pelo benefício e a expectativa de envelhecimento da população fazem do sistema previdenciário nacional um programa insustentável – argumentos contestados pela professora da UFRJ.
“O governo foi acometido por um senso de responsabilidade com o futuro e a Previdência que eu julgo desproporcional com a responsabilidade que ele tem tido com os problemas prementes de hoje. A Seguridade Social continua gerando superávit mesmo em um período de queda sistemática do PIB. [Ou seja], a nossa luta é contra a política macroeconômica, o ajuste fiscal. Não tem nada a ver com Previdência”, afirma Gentil.
Em estudo realizado recentemente pela doutora em economia pela UFRJ, os cortes em investimentos públicos são um dos fatores da derrubada da economia nacional e do resultado deficitário – fruto de cálculo inconstitucional e equivocado – do sistema previdenciário, utilizado como justificativa para a reforma.
“A desaceleração do investimento no primeiro governo Dilma não reflete somente um objetivo conjuntural, um objetivo de curto prazo, de contenção fiscal para enfrentar uma crise. Trata-se muito mais do que isso. Trata-se de um viés privatizante da política. Trata-se da preferência por criar estímulos fiscais e creditícios ao capital privado, às empresas privadas, abrindo espaço para sua atuação na economia”, alerta a professora, e completa: “Se o governo não investe, ele não estimula as empresas a investir”.
Os projetos de Lei do Senado 555/2015 e 131/2015 (já aprovado pela Casa e encaminhado à Câmara), que estabelecem a transformação de Estatais em Sociedades Anônimas (S/A) e a revogação da participação mínima da Petrobras no consórcio de exploração do pré-sal, respectivamente, são exemplos da abertura da economia à especulação do capital privado.
Para a palestrante, essas “contrarreformas” são consideradas estímulo à migração para a previdência privada. “O ajuste fiscal é um pretexto para empurrar as pessoas ao esquema de previdência privada. Por exemplo, o governo deteriora o Sistema Único de Saúde (SUS), as famílias pensam que não serão bem atendidas pelo serviço público e fazem um plano de saúde em um banco. É o mesmo raciocínio para a Previdência”, explica Gentil.
Segundo dados da Federação Nacional de Previdência Privada e Vida (FenaPrevi), a arrecadação dos fundos particulares foram de R$ 80,64 bilhões em 2014 e chegou a R$ 60,83 bilhões até agosto de 2015. Os fundos ainda tiveram a maior captação da história para o período de janeiro a setembro no mesmo ano, como divulgado pelo jornal O Estado de S. Paulo. Conforme informações da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais (Anbima), o lucro da previdência privada no intervalo foi de R$ 26,1 bilhões.
Propostas do governo e política industrial
A pesquisadora destacou os projetos de reedição da DRU (Desvinculação de Receitas da União), que tem como objetivo aumentar de 20% para 30% a destinação da arrecadação da Seguridade Social para o pagamento de juros da dívida pública.
A palestrante chamou a atenção também para as propostas de unificação das regras para homens e mulheres, trabalhadores urbanos e rurais, os setores públicos e privados; a desvinculação da aposentadoria ao aumento do salário mínimo; a proibição de acúmulo de benefícios e a estipulação de uma idade mínima para aposentadoria.
De acordo com análises de Denise Gentil e da professora de economia da PUC-SP Rosa Maria Marques, a fórmula 85/95 progressiva já estabelece uma idade mínima, que chegará a 65 anos para homens e 60 anos às mulheres em 2026, quando a fórmula passará para 90/100. Esta limitação é um fator prejudicial para quem entrou no mercado de trabalho mais cedo.
Soluções e perspectivas
Denise Gentil também destaca que um horizonte com mais idosos pode significar a supressão do maior problema do capitalismo: a insuficiência de demanda. “O que o futuro nos mostra é que teremos uma demanda contratada. O governo acha que os idosos escondem seu dinheiro no colchão, mas eles mal ficam com o dinheiro na mão, ele vai direto para as empresas com o consumo de vestuário, alimento, medicação. Então, não há prejuízo nenhum no pagamento de aposentadoria. O pagamento da Previdência produz dinamismo na economia”, reforça a doutora em economia.
A professora ainda relembra que os gastos com educação reduzirão já que o número de crianças e jovens na faixa etária de 0 a 17 anos vai diminuir; a produtividade aumentará com os jovens ativos e, assim, a arrecadação sobre a tributação dos lucros também. Segundo ela, haverá mais força de trabalho feminina, exigindo políticas de regulação no mercado com foco no pleno emprego, na redução da discriminação e na compensação da dupla jornada da mulher como trabalhadora e dona de casa.
“Nós deveríamos estar preocupados com 2022, quando teremos o auge da força de trabalho no Brasil. Eu pergunto para vocês: Nós estamos discutindo como vamos absorver esses jovens no mercado de trabalho? Não. Estamos pensando em 2040, 2050, 2060”, alerta a doutora, e conclui: “Os idosos serão a grande base eleitoral do futuro. Os idosos já são uma grande base eleitoral de hoje. O que esses caras estão fazendo? É um tiro no pé. O idoso que vai ser prejudicado vai ter que ir para a urna”.
Fonte: site da Cobap