No debate realizado no último domingo (28), foi destaque a reação raivosa de Bolsonaro à pergunta da jornalista Vera Magalhães sobre a queda na cobertura vacinal no Brasil. O presidente de ultradireita atacou de forma totalmente desrespeitosa a jornalista, ao invés de responder a pergunta.
Além de demonstrar, mais uma vez, a misoginia de Bolsonaro (ódio e desprezo às mulheres), o episódio suscita outra situação que se agravou no governo de ultradireita: a queda na vacinação no país e o retorno de doenças graves, em meio à falta de campanhas educativas e informativas por parte do governo junto à população.
Levantamentos que vêm sendo divulgados no último período revelam que a imunização infantil vem caindo de forma significativa no Brasil e se encontra atualmente nos mais baixos níveis dos últimos 30 anos.
Em 2021, cerca de 60% das crianças foram vacinadas contra a hepatite B, o tétano, a difteria e a coqueluche. Contra a tuberculose e a paralisia infantil, perto de 70%. Contra o sarampo, a caxumba e a rubéola, o índice não chegou a 75%. A baixa adesão se repetiu em diversas outras vacinas.
Para que exista a proteção coletiva e o Brasil fique blindado contra as doenças, o recomendável por médicos e especialistas é que entre 90% e 95% das crianças, no mínimo, estejam imunizadas.
Volta da poliomielite e do sarampo
A poliomielite, a grave doença que causa a conhecida paralisia infantil, voltou a assombrar em nosso país. Ela já foi considerada erradicada, mas o ressurgimento de novos casos ao redor do mundo, diante de um cenário de baixa cobertura vacinal no Brasil, acendeu a luz vermelha para o perigo.
Foi destaque na imprensa o caso de um jovem de 20 anos de Nova York que foi diagnosticado com o vírus da pólio em junho, sugerindo contágio já disseminado na população. A pólio também fez vítimas recentes na Ucrânia e em Israel. O vírus foi ainda detectado em amostras de esgoto londrino, nova-iorquino e de outras cidades.
O Brasil é considerado livre da paralisia infantil desde 1994. Porém, em 2021, foi registrado apenas 69,4% das crianças vacinadas. Com isso, o país voltou ao grupo de risco para a doença.
O governo iniciou no início deste mês de agosto a vacinação no país. O público-alvo inclui 14 milhões de crianças menores de cinco anos. Mas, prestes a encerrar o mês, o índice de vacinados é de apenas 24,8%.
O quadro em relação ao sarampo é semelhante. O Brasil também já foi considerado livre da epidemia da doença, por organizações internacionais como a OMS (Organização Mundial da Saúde) e Opas (Organização Pan-Americana de Saúde). Contudo, com a queda na imunização da doença, houve um surto em 2018 e o número de mortes por sarampo voltaram a ser contabilizados no país.
Médicos das áreas de pediatria, infectologia, epidemiologia e saúde coletiva temem que, se esse quadro de baixa vacinação for mantido, o país poderá assistir a novas catástrofes sanitárias, com o ressurgimento de epidemias que eram comuns no passado.
“Estamos brincando com fogo. Ao contrário do que muita gente acredita, essas doenças não são benignas. Elas são graves e, dependendo da situação, deixam sequelas e levam à morte”, aletou o infectologista José Cassio de Moraes, professor da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, em reportagem da Agência Senado.
A meningite e a caxumba, por exemplo, podem causar surdez. O sarampo pode retardar o crescimento e reduzir a capacidade mental. A difteria pode levar os rins à falência. A coqueluche pode provocar lesões cerebrais. Quando a mulher contrai a rubéola na gravidez, o bebê pode nascer com glaucoma, catarata e deformação cardíaca, entre outros problemas, além do risco de aborto.
Queda vertiginosa e falta de campanha
Questionado sobre esse quadro, em entrevista à imprensa, o ministro da Saúde Marcelo Queiroga atribuiu a baixa vacinação a uma “situação mundial”, em uma postura, repetida por Bolsonaro no debate deste domingo, de tentar se esquivar da responsabilidade.
De fato, os dados de redução da vacinação infantil são um fenômeno que vem sendo observado em vários países. Especialistas citam fatores como a falsa sensação de segurança por achar que as doenças foram erradicadas e que não são mais um risco ou que devam ter doses de reforço e a pandemia, quando as pessoas evitaram de ir aos postos de saúde temendo a contaminação do novo coronavírus.
Mas outros dois fatores destacados são os movimentos antivacina que surgiram em vários países e, no Brasil, teve o próprio presidente da República divulgando fake news e desestimulando a vacinação contra a Covid-19, bem como a redução de campanhas educativas.
A vacinação contra a gripe é um exemplo. Dados levantados pelo UOL, por meio da LAI (Lei de Acesso à Informação), mostram que a Campanha Nacional de Vacinação contra a Gripe deste ano acabou oficialmente em 24 de junho com apenas 47% da população alvo —78 milhões de pessoas— vacinada. No ano passado, a meta também não foi alcançada (52%), a primeira vez que isso aconteceu desde 1999.
Segundo o UOL, a verba para a realização de campanhas de vacinação também sofreram queda sob o governo de Bolsonaro. Foram destinados R$ 17 milhões para promover a campanha deste ano, 58% menos que em 2019. O valor é 46% menor que o de há dez anos (2013) e 82% abaixo dos R$ 92,6 milhões gastos na campanha contra a gripe de 2011, após correção pela inflação.
Outro aspecto dessa realidade é o desperdício criminoso de recursos públicos. Diante da baixa procura, muitas vacinas são descartadas porque alcançam o prazo de validade sem terem sido aplicadas.
Basta de negacionismo da ultradireita
Especialistas lamentam que tenham ficado para trás os tempos em que o Zé Gotinha, personagem criado em 1986, era figurinha fácil nas TVs, nos jornais e nas revistas. Primeiramente voltado à prevenção da paralisia infantil, o mascote serviu depois, com sucesso, a outras campanhas.
Bolsonaro disse que os imunizantes contra a Covid poderiam causar “morte, invalidez, anomalia” e que os vacinados “poderiam virar jacaré” ou “contrair o vírus da aids”. Também afirmou que, “em nome da liberdade”, ninguém deveria ser a obrigado a se vacinar. Em outra ocasião, declarou que a suspensão dos testes clínicos de uma vacina representava uma vitória política sua.
O próprio ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, lançou uma campanha informando que os pais poderiam escolher se queriam vacinar suas crianças ou não. A ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, abriu o Disque 100 para receber “queixas” de pessoas que se sentiam discriminadas por não estarem vacinadas contra a covid-19. A missão original do serviço é receber denúncias de violação dos direitos humanos.
Embora a vacinação das crianças de 5 a 11 anos contra a covid-19 tenha iniciado em janeiro deste ano, até o momento somente 60% desse grupo tomou a primeira dose e meros 30% já têm o esquema vacinal completo.
É esta realidade assustadora pela qual tem grande responsabilidade que Bolsonaro se negou a responder à Vera Magalhães, optando por atacá-la. Basta de negacionismo! Fora Bolsonaro e seu governo de ultradireita!
Fonte: CSP-Conlutas (com Agência Senado e UOL)